Sunday, December 03, 2006

Rios sem discurso - Análise Semiótica

Rios sem discurso

Quando um rio corta, corta-se de vez

o discurso-rio de água que ele fazia;
cortado, a água se quebra em pedaços,
em poços de água, em água paralítica.
Em situação de poço, a água equivale

a uma palavra em situação dicionária:
isolada, estanque no poço dela mesma,
e porque assim estanque, estancada;
e mais: porque assim estancada, muda
e muda porque com nenhuma comunica,
porque cortou-se a sintaxe desse rio,
o fio de água por que ele discorria.
O curso de um rio, seu discurso-rio,

chega raramente a se reatar de vez;
um rio precisa de muito fio de água
para refazer o fio antigo que o fez.

Salvo a grandiloqüência de uma cheia
lhe impondo interina outra linguagem,
um rio precisa de muita água em fios
para que todos os poços se enfrasem:

se reatando, de um para outro poço,
em frases curtas, então frase e frase,
até a sentença-rio do discurso único
em que se tem voz a seca ele combate.

(MELO NETO, João Cabral de. In: A educação pela pedra.Rio de Janeiro: José Olympio. 1979, p.26.)
O discurso mostra sua actorização formada por uma palavra que é retirada de um texto e o que pode ocorrer com o leitor para tentar reaver o sentido do texto, isto fica claro através da palavra discurso-rio. O poeta compara o rio a um texto; a palavra seria o fio de água que retirada do texto não possui sentido, como a poça de água ela fica incomunicável com as outras poças, equivale a uma palavra dentro de um dicionário. No texto tudo é relação, as palavras só possuem valor quando estão ligadas através do contexto, só assim passam a existir.
A análise da estrutura narrativa, deste poema, mostra um manipulador pressuposto: o escritor. Levando em consideração que não é possível nenhum texto se auto-escrever, já que é um ser inanimado e criação do autor, este nada pode fazer quando seu criador “corta” uma palavra de seu todo; o texto não sente a falta deste “fio d’água” para recompô-lo. Esta palavra, como já foi dito, está “muda” e portanto não pode constituir por si só um todo de sentidos, e este texto “mutilado”.
Antes de continuarmos vale uma ressalva, todo o poema é construído no nível do projeto, ou seja, o escritor (elemento manipulador) não executa a ação, apenas supõe o que pode ocorrer; ele sabe e pode fazer, mas não põe em prática, planeja.
Sem uma palavra no texto, o leitor (sujeito manipulado) pode recorrer a duas estratégias para prosseguir sua leitura:

A primeira é que o leitor pode usufruir seu conhecimento enciclopédico, realizando inferências no texto predestinado, completando, assim, o espaço deixado para retomar o sentido original;
A segunda é que o leitor vai impor um novo significado ao texto para poder prosseguir, reatando todas as lacunas reconstruindo o contexto.

Como já dissemos, a pressuposição é uma característica deste poema, pois a competência é pressuposta através das alternativas que os leitores possuem, como “o corte” no rio-discurso não se realiza realmente, mas é um acontecimento hipotético este é um conhecimento lingüísticos no uso da conjunção caso (presente no 17º verso) e se (presente no 24º verso).
Não existe sanção clara já que os fatos são estipulados pelo manipulador o que não deixa clara a ocorrência deles, contudo pode vir a ser positiva se os leitores conseguirem realizar uma das duas opções determinadas pelo autor eles poderão estar em estado de euforia com o objeto valor (o texto). As duas hipóteses são construídas sobre enunciados de estado; os leitores precisam estar de porte de objetos respectivamente “vários fios de água” e “a grandiloqüência de uma cheia” para alcançarem outro objeto, este sim o objeto valor(texto).

O poema possui predominância de elementos temáticos já que encontramos muitos elementos abstratos e é através deles que fazemos o seguinte encadeamento de temas:

a) uma palavra fora do contexto não possui valia;
b) um texto sem uma palavra conta a ser texto;
c) o autor nem sempre escreve para o leitor;
d) o leitor precisa ter competência para ler um texto;
e) Com essa competência o leitor atinge o conhecimento.

TEMA: O texto precisa não apenas das habilidades do escritor para prosseguir seu percurso, mas depende do leitor também.

Encontram-se no poema alguns grupos lexicais:

No primeiro dele encontramos palavras que pertencem ao universo da língua portuguesa como “discurso”, “dicionária”, “sintaxe”, “linguagem”, “enfrasem”, “frases”, “sentença”; isto mostra o domínio que o poeta possui da própria língua, principalmente de suas instâncias normativas.

No segundo, temos, elementos do mundo natural como: “rio”, “água”, “poço”, “fio de água”, “seca”, estas palavras se utilizam para realizar uma analogia, o poeta tem um caráter didático como se desejasse se aproximar do leitor.

No terceiro, encontramos verbos como “cortar”, “quebrar”, “estancar”, “reatar”, “refazer”, “enfrazar”, que não são características do mundo natural, mas do mundo das letras, o que mostra que o texto está construído com uma malha conotativa. O poeta não está falando do rio, mas sim da composição de um texto.

João Cabral de Melo Neto é conhecido como “arquiteto das palavras”, os verbos empregados no poema lembram trabalhos manuais dificultosos e árduos, ou seja, o poeta enxerga o ato de escrever um poema como um processo de construção e por ser difícil não sabe realmente se o leitor pode alcançar seu todo de significados. Cabral explica que ao cortar uma palavra do texto o leitor precisa, seguir adiante para alcançar o entendimento, reatar este vazio no texto, para isso deve contar apenas com suas habilidades lingüísticas e cognitivas para fazê-lo. Ou vai recorrerá a seu banco semântico, e colocar outra palavra no lugar da que está faltando ou esperar que o contexto, daí o termo, “outra linguagem”, dê-lhe a compreensão de que tanto precisa.

CRITICA E SUGESTÕES: l.antoniobn@gmail.com

Thursday, September 07, 2006

Denotação, conotação e polissemia.

As palavras são elementos fundamentais em um texto, mas não existem sozinhas precisam de outras para formar um todo significativo, o contexto. Entende-se por contexto uma unidade lingüística de âmbito maior, na qual se insere outra unidade de âmbito menor. Dessa forma, a palavra (unidade menor) se insere no contexto da frase (unidade maior); a frase se insere no contexto do período; o período se insere no contexto do parágrafo e assim por diante.
Entretanto eis,ai, onde mora o perigo. Uma palavra pode esconder armadilhas como a polissemia, ou seja, os vários significados que uma palavra pode possuir. Vejamos a palavra linha, por exemplo, que pode evocar os conceitos de material próprio para costurar ou bordar tecidos, os trilhos de um trem, conduta de uma pessoa..., portanto existe uma necessidade de saber quando e onde utilizar a determinada palavra. Uma dica valiosa é conhecer bem o significado que se quer utilizar.
Outra arma do aluno na hora de redigir um texto é empregar o sentindo conotativo das palavras. Todas as palavras por mais polissêmicas que possam ser possuem um sentido próprio, mas a ela podem ser inseridos outros que só faz sentido dentro de um contexto. Vejamos um exemplo clássico em uma das músicas de Chico Buarque, Roda Viva:

A gente vai contra a corrente
Até não poder resistir
Na volta do barco é que sente
O quanto deixou de cumprir


A palavra corrente no Houaiss significa conjunto de argolas, correnteza, ou seja, nenhum deles consegue expressar o que mestre Chico Buarque quis dizer. A gente vai contra a corrente, traduzindo, estamos indo contra a opinião da maioria. Percebem como este recurso se bem utilizado demonstra um amadurecimento lingüístico?
Contudo, uma pergunta muito freqüente dos alunos é como a pessoa que está lendo vai perceber isto? Vamos resgatar uma palavra que usamos no início do texto através da coerência do texto é possível captar o sentido de todas as palavras no contexto.

Profº. Luís Antônio

Email:
l.antoniobn@gmail.com

Tuesday, August 22, 2006

Por que pai se chama pai?


Assunto: etimologia das palavras


É curioso o estudo de algumas palavras. Nesse dia dos pais vamos pensar um pouco sobre a palavra símbolo.
Pai vem do latim pater. É por isso que o amor de pai é paterno e não paino. Analogia com a grafia em inglês father não é mera coincidência, haja visto que o idioma do tio Sam também possui uma raiz do latim. Que por sinal em um estudo mais aprofundado vamos encontrar a variante patre dessa vem pátria, patriarca e patriarcal, mas nenhuma delas pode comportar os sentimentos contidos no vocábulo atual.
Como disse Fábio Júnior na letra, antológica, da canção “Pai”:

“...você é meu herói
e meu bandido...”

FELIZ DIA DOS PAIS!!!

Profº. Luís Antônio

Monday, July 31, 2006

Reler, Repensar e reescrever: os três “res” são a solução.

Imagine que você vai a uma festa. Lá estarão muitas pessoas e, principalmente, aquela que faz seu coração bater mais forte. Tenho certeza que você não ira se vestir com as primeiras peças de roupas do guarda-roupa. Por que meus prezados alunos não possuem esse mesmo cuidado com suas redações?
Escrever um texto não é obra do acaso. Trata-se de um trabalho muitas vezes árduo e penoso. E muitos escritores escreveram frases sobre o ato de escrever. Ernest Hemingway autor do livro belíssimo “O velho e o mar” disse: “O primeiro móvel da casa de um escritor é o cesto de lixo”. Se sumidades do mundo das letras pensam assim, então por que com um texto dissertativo seria diferente?
Veja como Guimarães Rosa encarava o processo de construção (vocês verão que o caráter semântico desta palavra não foi à toa): “Minha obra é trabalhada, retrabalhada, repensada, calculado, rezado, refervido, recongelado, descongelado, purgado, reengrossado e filtrado.” Ficaram admirados? Vocês não achavam que elaborar uma prosa em linguagem culta com pitadas de regionalismo aconteceria assim, de repente? (Espero que tenha pensado em um “não”.)

Por isso fera, não tenha medo de estar sempre aperfeiçoando seus escritos na busca do texto perfeito. Não precisa ser como Kafka que escreveu seu principal romance “O processo” de uma única sentada. RELEIA aquelas redações ‘nota baixa’, procure fazer isso seguindo os conselhos do professor. REPENSE. As críticas não estão no verso de seus textos por acaso, nem são chagas, mas apenas dicas acerca do que redigiu. E finalmente REESCREVA-OS.
Pense nisso!

Prof.º Luís Antônio